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sábado, 24 de dezembro de 2011

Boas Festas - Recesso

Boas Festas - Recesso
Johannes Vermeer, "O Geógrafo", Delft, 1668

Caros amigos, chegamos mais uma vez ao final de mais um período. Ano difícil muitas tristezas, mas também muitas alegrias, grandes enfrentamentos muitas batalhas, mas como diria um amigo nosso, não afrouxamos, nunca nos acovardamos, mesmo sabendo que em algumas batalhas a derrota era iminente! Mas como sabemos não se vence uma guerra sem derrotas, são elas que valorizam nossas vitórias.



Eu gosto de gente que vibra, que não tem de ser empurrada, que não se tem de dizer que faça as coisas, mas que sabe o que tem que fazer e que faz. Gente que cultiva seus sonhos até que esses sonhos se apoderam de sua própria realidade.

Impossível ganhar sem saber perder.

Impossível andar sem saber cair.

Impossível acertar sem saber errar.

Impossível viver sem saber reviver.

A glória não consiste em não cair nunca, mas em levantar-se todas as vezes que seja necessário.

E ISSO É ALGO QUE MUITO POUCA GENTE TEM O PRIVILEGIO DE PODER EXPERIMENTAR.

Bem aventurados aqueles que já conseguiram receber com a mesma naturalidade o ganhar e o perder, o acerto e o erro, o triunfo e a derrota...



Mario Benedetti

Nesse ano não tivemos tempo suficiente para dinamizar nosso espaço de debates, mas acredito que em 2012 podemos ir além. Vamos dar um tempo voltamos em fevereiro de 2012.

Boas Festas e um Feliz 2012!


Johannes Vermeer, "O Geógrafo", Delft, 1668

domingo, 30 de outubro de 2011

Camila Vallejo Menina Veneno!

Ao comando de Camila Vallejo

The Observer16 de outubro de 2011
Jonathan Franklin, de Santiago

 
Das manifestações no Chile a símbolo mundial do movimento estudantil. Foto: Martin Bernetti/AFP

Enquanto o sol da tarde de sexta-feira descia em direção ao horizonte, alguns estudantes da Universidade do Chile jogavam pingue-pongue ou futebol e casais descansavam e se beijavam ao último calor do dia. Mas outros tinham questões mais sérias na cabeça: a rebelião estudantil extremamente popular que transformou a agenda política do país. E para muitos dos manifestantes envolvidos e os que simpatizam com seus objetivos a face da rebelião é Camila Vallejo. Em um auditório em um porão, um grupo de 60 líderes estudantis planejava os próximos passos de sua revolução incipiente pela educação universitária gratuita, com Camila no centro do palco.
Ela estava sentada atrás de seu velho laptop, com um pequeno caderno azul sobre a mesa e um público cativo à sua frente. Quando fala, suas mãos revoam como pássaros apanhando presas invisíveis. Sua linguagem é pontuada e clara, mas misturada com constantes doses de humor e autozombaria, ela faz suas acusações rindo.
Como segunda mulher presidente do principal órgão estudantil do Chile, conhecido como Federação de Estudantes da Universidade do Chile (Fech), Camila Vallejo, que também integra o braço jovem do Partido Comunista, a JJCC, preside o maior movimento democrático civil desde o tempo das marchas de oposição ao general Augusto Pinochet, há uma geração.
A reação do governo lembrou a muitos chilenos mais velhos aquela época sombria. Na quinta-feira 6, a polícia antimotim chilena emboscou Camila e um grupo de líderes estudantis logo depois de uma entrevista coletiva no centro de Santiago.

“Eles (a polícia) visaram a liderança com violência”, disse Ariel Russell, estudante da Universidade do Chile que presenciou o ataque. “Nem tínhamos começado a marchar e o aparato policial estava sobre nós.”

Camila Vallejo, uma estudante de Geografia de 23 anos, cantava e marchava com um cartaz escrito à mão quando um esquadrão de veículos militares a fechou e atacou com jatos de gás lacrimogêneo. Um par de caminhões montados com canhões de água despejou uma barragem de água forte o suficiente para quebrar ossos e arrastar uma pessoa pelo asfalto. Ela ficou molhada e, então, uma nuvem de gás foi projetada sobre seu corpo. Com a pele molhada, a reação química foi maciça e paralisante. O corpo de Camila entrou em reação alérgica e surgiram bolhas causadas pelo gás.

Foto: Martin Bernetti/AFP

“No início, nós resistimos, mas foi insuportável”, disse ela ao Observer. “Você não conseguia respirar, era complicado, tivemos de fugir dos carabineros (a polícia) e, depois, outro canhão de água nos atingiu de frente com outra substância, muito mais forte… Todo o meu corpo queimava, foi brutal.”

Nas quatro horas seguintes, jornalistas foram espancados e 250 pessoas, detidas. Vinte e cinco policiais ficaram feridos quando jovens mascarados e com bombas de tinta e punhados de pedras contra-atacaram. Durante toda a tarde, o centro de Santiago foi tomado por lutas de rua entre unidades da polícia fortemente armadas e centenas de manifestantes de short e tênis, e cachecóis para se proteger do gás.
Enquanto esquadrões da polícia atacavam os estudantes, os pedestres e até uma ambulância, Camila Vallejo se escondeu em um escritório, recebeu cuidados médicos e monitorou a situação pelos relatos por telefone celular de uma equipe de batedores nos arredores do que logo se tornou tumulto.
O governo culpou Camila pelo caos: ela havia feito o apelo muito divulgado, mobilizando seus seguidores a se reunir na Plaza Itália, um parque público, e marchar ao longo da Alameda, a principal avenida da capital, que fica a menos de 2 quilômetros do palácio presidencial, levemente guardado. A líder estudantil rapidamente retrucou que as reuniões públicas não precisam de autorização e que a polícia havia atacado ilegalmente estudantes parados em um parque.
Camila, uma jovem eloquente e bonita que exala autoconfiança e estilo, deixou a violência de lado e se concentrou no que ela considera as conquistas positivas até agora. “Durante anos a juventude chilena foi consumida por um modelo neoliberal que salienta a conquista pessoal e o consumismo; tudo tem a ver com eu, eu, eu. Não há muita empatia pelo outro”, diz em seu escritório, decorado com uma grande foto de Karl Marx.

“Este movimento conseguiu exatamente o contrário. Os jovens assumiram o controle e reviveram e dignificaram a política. Isso vem de mãos dadas com o questionamento de modelos políticos desgastados – tudo o que eles fizeram é governar para as grandes empresas e grupos econômicos poderosos.”

Em questão de poucos meses, Camila Vallejo foi projetada de presidente de um órgão estudantil anônimo a herói popular latino-americana com mais de 300 mil seguidores no Twitter. Digite seu nome no Google e haverá mais de 160 mil resultados apenas nas últimas 24 horas. Os estudantes brasileiros hoje a exibem como convidada vip em suas marchas, o presidente do Chile a convida para negociar um acordo e, quando ela pede uma demonstração de força, centenas de milhares de estudantes de todo o Chile vão às ruas. Como adepta e um fenômeno de mídia social extremamente popular, a líder ascendeu para se tornar um rosto mais identificável nos protestos estudantis.
Durante a revolta de seis meses, os estudantes chilenos – em muitos casos liderados por jovens de 14 e 15 anos – ocuparam as ruas de Santiago e outras grandes cidades, provocando e contestando o status quo com sua exigência de uma reestruturação maciça na indústria da educação superior do país. Em apoio às suas demandas por uma educação gratuita, desde maio eles organizaram 37 marchas, que reuniram mais de 200 mil estudantes de cada vez.
A repressão policial foi frequente. Vândalos que muitas vezes usam a cobertura dos protestos estudantis para atacar bancos, farmácias e empresas de serviços públicos encontraram uma força armada da polícia antimotim habituada a atacar pedestres e atirar gás lacrimogêneo em multidões de civis inocentes.
O que começou como um apelo tranquilo por melhoras na educação pública agora surge como uma rejeição total à elite política chilena. Mais de cem colégios em todo o país foram ocupados por estudantes e uma dúzia de universidades acabou fechada pelos protestos.
Amplamente admirada por seus discursos na televisão chilena, Camila Vallejo reuniu um público admirador em todo o mundo, que vai desde tributos do rock- alemão a vídeos da maior universidade da América Latina, a Universidade Nacional Autônoma do México. “Essa internacionalização do movimento foi muito importante para nós”, diz Camila, que recebe um dilúvio diário de correspondência de fãs e convites para fazer palestras e seminários.

Aqui no Chile ouvimos constantemente a mensagem de que nossas metas são impossíveis e que não somos realistas, mas o resto do mundo, especialmente a juventude, está nos dando muito apoio. Estamos em um momento crucial nesta luta e o apoio internacional é fundamental.”

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Leia mais em http://www.guardian.co.uk/

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Juíz Detona a Manipulação da Mídia

Juiz critica monopólios na mídia e aponta manipulação em cobertura da RBS



O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), João Ricardo dos Santos Costa, criticou a cobertura que o jornal Zero Hora fez de um seminário sobre liberdade de imprensa e Poder Judiciário, em Porto Alegre. A matéria sobre o evento omitiu a parte do debate relacionada aos monopólios de comunicação. “Esse é um caso paradigmático: em um evento promovido para discutir a liberdade de imprensa, a própria imprensa comete um atentado à liberdade de imprensa ao omitir um dos principais temas do evento", diz o juiz em entrevista à Carta Maior.



Marco Aurélio Weissheimer
Data: 24/10/2011  

 




No dia 21 outubro, a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e a Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris) promoveram, em Porto Alegre, um seminário para discutir liberdade de imprensa e Poder Judiciário. O convite para o encontro partiu da ANJ que já promoveu um debate similar junto ao Supremo Tribunal Federal (Ver artigo de Venício Lima, Direito à comunicação: o “Fórum” e a “Ciranda”). Os interesses temáticos envolvidos no debate não eram exatamente os mesmos. Enquanto que a ANJ e as suas empresas afiliadas estavam mais interessadas em debater a liberdade de imprensa contra ideias de regulação e limite, a Ajuris queria debater também outros temas, como a ameaça que os monopólios de comunicação representam para a liberdade de imprensa e de expressão.

O jornal Zero Hora, do Grupo RBS (e filiado a ANJ) publicou no sábado (24/10/2011) uma matéria de uma página sobre o encontro. Intitulada “A defesa do direito de informar”, a matéria destacou as falas favoráveis à agenda da ANJ – como as da presidente da associação, Judith Brito, e do vice-presidente Institucional e Jurídico da RBS, Paulo Tonet – e omitiu a parte do debate que tratou do tema dos monopólios de comunicação. Na mesma edição, o jornal publicou um editorial furioso contra o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, acusando-o de querer censurar o jornalismo investigativo (Ver matéria: Tarso rechaça editorial da RBS e diz que empresa manipulou conteúdo de conferência). No mesmo editorial, o jornal Zero Hora apresentou-se como porta-voz da “imprensa livre e independente” e afirmou que “a credibilidade é a sua principal credencial”.

Agora, dois dias depois de o governador gaúcho acusar a RBS de ter manipulado o conteúdo de uma conferência que proferiu no Ministério Público do RS, omitindo uma parte que não interessava à construção da tese sobre a “censura ao jornalismo investigativo”, mais uma autoridade, desta vez o presidente da Ajuris, João Ricardo dos Santos Costa, vem a público criticar uma cobertura da RBS, neste caso, sobre o evento promovido em conjunto com a ANJ. A omissão da parte do debate relacionada ao tema do monopólio incomodou o presidente da Associação de Juízes.

“Esse é um caso paradigmático: em um evento promovido para discutir a liberdade de imprensa, a própria imprensa comete um atentado à liberdade de imprensa ao omitir um dos principais temas do evento que era a discussão sobre os monopólios de comunicação”, disse João Ricardo dos Santos Costa em entrevista à Carta Maior.

Na entrevista, o presidente da Ajuris defende, citando Chomsky, que “o maior obstáculo à liberdade de imprensa e de expressão são os monopólios das empresas de comunicação”. A “credibilidade” reivindicada pela RBS no editorial citado não suporta, aparentemente, apresentar a voz de quem pensa diferente dela. “O comportamento do jornal em questão ao veicular a notícia suprimindo um dos temas mais importantes do debate, que é a questão dos monopólios, mostra justamente a necessidade daquilo que estamos defendendo”, destaca o magistrado.

Carta Maior: Qual foi o objetivo do seminário sobre Liberdade de Imprensa e Poder Judiciário e quais foram os principais temas debatidos no encontro realizado dia 21 de outubro em Porto Alegre?

João Ricardo dos Santos Costa: A Ajuris foi procurada pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) para promover um evento com o objetivo de debater liberdade de imprensa e o Poder Judiciário. A relação se justifica pelo grande número de questões que chegam ao Judiciário envolvendo a atividade jornalística. Essas questões envolvem, muitas vezes, decisões que limitam a divulgação de certas matérias. Pois bem, fomos procurados para fazer esse debate que gira em torno de dois valores constitucionais: a liberdade de expressão e a independência do Judiciário. Para alguns haveria um aparente conflito entre esses dois princípios. Nós nos dispomos, então, a construir por meio do debate o que significa a convivência desses dois valores em sociedade democrática. Esse foi o grande desafio que esse evento pretendia enfrentar.
Há duas posições veementes neste debate. De um lado há aqueles que não admitem nenhum tipo de cerceamento à informação; de outro, há aqueles que não admitem qualquer tipo de restrição ao trabalho do Judiciário. Do ponto de vista constitucional, cabe ao Judiciário solucionar todos os conflitos, inclusive os que envolvem a imprensa. A imprensa não está fora das regulações judiciais. Há um embate muito forte entre essas duas posições. Se, de um lado, a ANJ buscou explorar o tema da liberdade de imprensa sob a ótica da atividade judicial, nós buscamos fazer um debate sobre a questão constitucional da liberdade de imprensa, no que diz respeito à distribuição de concessões aos veículos de comunicação.

Carta Maior: Por que a Ajuris decidiu abordar o tema da liberdade de imprensa sob essa ótica?

João Ricardo dos Santos Costa: Chomsky tem dito que o maior obstáculo à liberdade de imprensa e de expressão são os monopólios das empresas de comunicação. Não só ele, aliás. Vários pensadores contemporâneos dizem a mesma coisa. Para nós, esse é o cerne da questão. Hoje não há pluralidade, não há apropriação social da informação. O que existe é o interesse econômico que prepondera. Os editoriais são muito mais voltados aos negócios. Hoje mesmo, o editorial de um jornal local [Zero Hora/RBS] expressa preocupação com a vitória de Cristina Kirchner na Argentina dizendo que seria um governo populista que teria explorado o luto [pela morte de Néstor Kirchner] para se reeleger.
Há toda uma preocupação sobre o que representa esse governo para os negócios das empresas de comunicação, em especial no que diz respeito ao conflito entre o governo argentino e o grupo Clarín. A sociedade brasileira só tem conhecimento do lado da empresa de comunicação. A visão do governo argentino sobre esse tema nunca foi exposta aqui no Brasil.
E aí vem uma questão fundamental relacionada à liberdade de imprensa. O problema não é o que os meios de comunicação veiculam, mas sim o que omitem. Esse é o grande problema a ser superado.

Carta Maior: E esse tema foi debatido no seminário?

João Ricardo dos Santos Costa: No nosso evento, eu lembro de uma fala do deputado Miro Teixeira. Ele disse que a história da censura envolve o cerceamento de grandes pensadores da humanidade, como Descartes, Locke, Maquiavel, Montesquieu, entre outros. Citou isso para exemplificar os danos sociais dessa censura. Mas hoje o que nós observamos é que os grandes pensadores contemporâneos são cerceados não pelos censores que existiam antigamente, mas pelos próprios detentores dos meios de comunicação. Os grandes meios de comunicação não veiculam, não debatem hoje os grandes pensadores da humanidade. Nomes como Amartya Sen, Noam Chomsky, Hobsbwan, entre outros, não têm suas ideias discutidas na mídia, não são procurados para se manifestar sobre as grandes questões sociais. Não são chamados pela grande mídia para dar sua opinião e o que acaba prevalecendo é o interesse do capital financeiro, que é aquele que não vai pagar a conta da crise.
Eu dou esse exemplo para demonstrar a gravidade do problema representado por esse monopólio, esse interesse econômico preponderante sobre o direito à informação. Esse interesse diz incessantemente para a sociedade que a única saída para superar a crise atual é por meio do sacrifício dos mais pobres e dos setores médios da população. Não se toca na questão do sacrifício do setor financeiro. Este setor não pode ter prejuízo. Quem vai ter prejuízo é a sociedade como um todo, mesmo que isso atinja direitos fundamentais das pessoas.
Então, esse debate sobre a democratização dos meios de comunicação é extremamente importante e deve começar a ser feito de forma transparente para que a sociedade se aproprie do que realmente está acontecendo e que possa ter autonomia em suas decisões e mesmo influenciar a classe política que hoje está entregue aos grandes financiadores de campanha que são os mesmos que fornecem a informação enlatada que estamos recebendo. Nós, da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, estamos propondo esse debate para a sociedade.

Carta Maior: Esse debate que o senhor relatou não apareceu na cobertura midiática do encontro pelo grupo RBS, que participou do mesmo. O jornal Zero Hora dedicou uma página ao encontro, com uma matéria intitulada “A defesa do direito de informar”, sem fazer nenhuma menção a essa parte do debate envolvendo os temas do monopólio e da democratização dos meios de comunicação. Como é que a Ajuris, que propôs esse debate, recebe esse tipo de cobertura?

João Ricardo dos Santos Costa: O comportamento do jornal em questão ao veicular a notícia suprimindo um dos temas mais importantes do debate, que é a questão dos monopólios, mostra justamente a necessidade daquilo que estamos defendendo. É como eu disse antes: o problema maior é aquilo que é omitido, aquilo que não é revelado. Esse é um caso paradigmático: em um evento promovido para discutir a liberdade de imprensa, a própria imprensa comete um atentado à liberdade de imprensa ao omitir um dos principais temas do evento que era a discussão sobre os monopólios de comunicação. Nós não vamos nos omitir em tratar desse assunto por mais dolorido que ele possa ser. É evidente que não é um assunto que deva ser banalizado. Ele é o mais importante de todos. Estamos tratando de pluralidade de pensamento.

Carta Maior: No debate, o deputado federal Miro Teixeira defendeu que a liberdade de imprensa é um direito absoluto. Qual sua opinião sobre isso?

João Ricardo dos Santos Costa: Eu compartilho a ideia de que não há nenhum direito absoluto, não pode haver. Neste contexto de monopólio, menos ainda. Liberdade absoluta de imprensa em um contexto onde sequer a Constituição Federal é cumprida. no sentido de proibir a existência de monopólios. É algo completamente daninho à democracia. Outra coisa com a qual eu também não concordo , envolvendo esse debate, é a afirmação do ministro Marco Aurélio Buzzi (do Superior Tribunal de Justiça) de que nós temos liberdade até para matar. Nós não temos liberdade para matar. Não vejo, dentro da nossa organização jurídica e de sociedade, que tenhamos liberdade para matar. Do fato de, no Código Penal brasileiro, “matar alguém...pena de tanto a tanto” aparecer como uma expressão afirmativa, não se segue o direito de matar. Nós não podemos matar e não podemos violar o Direito. Não temos essa liberdade. Não temos a liberdade de tirar a liberdade das outras pessoas. O direito individual não chega a esse radicalismo que se pretende com essa afirmação de que a liberdade de imprensa é um direito absoluto.

Carta Maior: A ANJ realizou recentemente, no Supremo Tribunal Federal (STF), um seminário semelhante a este realizado no Rio Grande do Sul. Há, portanto, uma óbvia preocupação com a posição do Poder Judiciário neste debate. Qual é, na sua avaliação, o papel do Judiciário neste contexto?

João Ricardo dos Santos Costa: O fato de se debater, em primeiro lugar, é um grande caminho para amadurecer esses institutos que, aparentemente, estão colidindo, na sociedade. É lógico que o Judiciário, nesta e em outras grandes questões da sociedade brasileira, tem sido provocado a se pronunciar. Muito pela ineficiência do Poder Legislativo. O STF tem decidido sobre questões que o Legislativo se mostra incapaz de resolver: união homoafetiva, aborto, demarcação de terras indígenas, células-tronco, entre outros. A pressão envolvendo esses temas está vindo para cima do Judiciário. E o Judiciário, por sua formatação de autonomia e independência, ele se mostra menos vulnerável a pressões. Decidir é da essência do Poder Judiciário, desagradando um dos lados em litígio.
Quando esse lado é muito poderoso, os danos à instituição podem ser pesados. Numa decisão, por exemplo, que contraria os interesses de um monopólio de comunicação, esse monopólio joga todo esse seu poder para atingir a credibilidade do Judiciário como instituição. Creio que aí aparece um outro grande debate que deve ser feito sobre até que ponto esse tipo de postura não corrói a nossa democracia.